terça-feira, 7 de janeiro de 2014

Fisioterapia e o canto – o corpo do cantor

Por Carolina Valverde
Fonte: Jornal Musical - Sindmusi/RJ


Continuando nossa conversa sobre a saúde do cantor, nessa edição, resolvi falar um pouco sobre o canto pelo olhar da Fisioterapia. Muitos cantores me perguntam se eu também atendo cantores no meu consultório, pois quando ouvem falar de Fisioterapia para músicos pensam logo nos instrumentistas. Talvez por causa dos movimentos repetitivos e da sustentação do instrumento. Quando falamos em saúde do cantor tendemos a pensar em profissionais como fonoaudiólogos e otorrinos como os únicos responsáveis
pelo atendimento e acompanhamento de problemas relacionados a performance do canto. Porém, o fisioterapeuta trata de muitos aspectos neste sentido. Um exemplo muito interessante que tenho é de uma cantora lírica que procurou o consultório com queixas de vertigem, falta de ar na hora da performance do
canto e dificuldade de chegar em algumas notas agudas. Durante a avaliação em performance pude observar dois padrões corporais muito claros: hiperextensão de joelhos e retificação de coluna cervical. Após a conscientização da cantora e tratamento, os sintomas desapareceram. Uma relação anatômica muito importante que diz da importância de utilizarmos o conhecimento de todo o funcionamento do aparelho ortopédico para compreender os problemas corporais dos cantores é, por exemplo, o fato dos pilares que saem do diafragma serem inseridos na coluna lombar. Essa relação anatômica faz com que haja uma dependência direta entre postura e respiração, o que interfere, necessariamente no canto. Além disso, existem muitas outras relações entre o canto e o corpo do cantor. Por isso, além das aulas teóricas e práticas na Escola de Música da UEMG, onde tenho muitos alunos cantores, estou desenvolvendo uma pesquisa para a construção de um workshop teórico/prático que, a princípio, será oferecido às cidades de MG, próximas de Belo Horizonte. Conto, neste trabalho, com a ajuda de Helen Isolani, soprano e bacharelanda em canto, interessada em educação musical e saúde do cantor. Para ilustrar a nossa conversa, elaborei algumas perguntas para que Helen nos mostre um pouco de sua prática como cantora no que diz respeito aos problemas corporais relacionados à prática do canto. Vejamos o que ela nos conta.

Você tem queixas corporais relacionadas a sua performance de canto? Quais?
Sim, tenho queixas. Após a performance sinto dores lombares e no meio das costas. Na verdade, a maioria dos cantores sentem dores nestes locais, pois nas costas (final da torácica) há inserção posterior do diafragma músculo que é essencial para a técnica do canto, onde não há respiração torácica e sim diafragmática. Os pilares diafragmáticos se inserem na região lombar. Ainda submeto-me a tratamento
também na região cervical e trapézios pela super- ativação dos respiratórios acessórios. Pode acontecer cefaléias advindas da tensão cervical.

Você consegue relacioná-las diretamente com sua prática?
Sim. Depende da performance, do tempo da performance (duração), do figurino, do sapato, do nível
de dificuldade do repertório, da temperatura, da acústica, do meu relaxamento (ou cansaço), do meu estado interno (estabilidade emocional) e, enfim, questões humanas e ergonômicas interferindo em todo o processo de performance musical. Não é bom cantar sentado. Mas, se tem de cantar em pé é importante estar bem apoiado (pelos pés) e com uma roupa que não incomode (não seja apertada). Para uma performance, de canto erudito, de uma hora (por exemplo) é importante se acostumar com o repertório, fazer exercícios musculares e alongamentos para que haja sustentação para esta prática, incluindo exercícios físicos regulares.

As dores nas costas estão relacionadas com a respiração e pelos movimentos diafragmáticos. O tipo de roupa e sapato pode influenciar seu bem estar corporal durante e após a performance?
Bem, como disse na resposta anterior, as roupas e sapatos influenciam demais na performance. Um
sapato que influencia positivamente na prática do canto é o tênis: feito para atleta, anatômico, tem amortecedores, preparado para a corrida, te proporciona segurança. Mas, quase sempre, não podemos fazer performance de tênis. Então, temos de acostumar com o sapato do dia da performance. Ensaiar com ele. Encontrar segurança. Pernas e pés são extremamente importantes para a prática do canto, pois são bases e sustentação. Se é uma performance que também é teatral como a ópera, além do canto há movimento cênico. Assim, é preciso praticar sempre esta movimentação para que o corpo se acostume e tenha segurança em cena. Quanto a roupa, ela tem de deixar você a vontade para o movimento. Principalmente nas costas. Geralmente os figurinos são personalizados: o figurinista faz a roupa de acordo com o cantor, levando em consideração questões corporais, o personagem (que o cantor interpretará) e o que se fará em cena.

Quais ações você vê como essenciais para a saúde corporal do cantor?
Como cantora, educadora musical eu levo em consideração todas as questões citadas acima. A voz pertence ao corpo. Cuidar da voz é cuidar bem de si mesmo. No mais, o de sempre: dormir (muito!),
beber muita água, estudar muito, alongar e ser feliz.

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